Comida · Food

Food, food waste and what I’ve learned over the years

Foto: Jean-Christophe Verhaegen/AFP Fonte: Fao.org


In recent years, especially since I started researching the topic of sustainability in relation to food and wine production, I have come to see food waste through a magnifying glass. At the same time, in my daily life, I began to feel increasingly uncomfortable with this waste and a need to get around it, at least in terms of the possibilities I have in this regard.

A series of events made me more open to changing my habits in order to avoid food waste. The fact that I have embraced vegetarianism for several years has helped me expand my food repertoire and deal with food in a different way. When cooking, I began to make the most of vegetables and fruit, incorporating their peelings, stalks and leaves into recipes, i.e. parts of the plant that are usually discarded. For example, I started cooking pumpkin with the peel on, using the stalks of broccoli, cauliflower and parsley, as well as leaves such as beet and celery.

Over time, as I began to delve deeper into academic research related to the issues surrounding the production of waste based on the theme of sustainability, I adopted another tactic. Instead of buying food with a view to creating certain recipes, I started cooking mainly from what I buy at the agroecological market at the end of the week.

As a result, I got into the habit of conditioning my diet to the seasonality of fruit and vegetables. In addition, I’ve started to avoid throwing food away or letting it spoil without making use of it, and one of the solutions to prevent this from happening has been to reduce the amount of food I buy. Freezing surplus food or ingredients has also become a resource in the same sense.

Perhaps these examples are absolutely basic or minimal in terms of sustainability in the kitchen, but little by little I’m learning more about the subject and trying to improve myself. I’ve never really considered myself an environmental activist, not least because actions in this direction go far beyond the kitchen. Apart from that, I confess that, despite all my efforts, I don’t always manage to follow all these self-imposed “rules” to the letter. Sometimes I end up buying too much food and many of these foods don’t wait with the same vitality until I feel like including them in a recipe or some other unforeseen situation causes me to postpone their consumption, such as having a craving for some other food or even choosing to eat some meals away from home.

According to FAO data, a third of the food produced in the world is lost or wasted every year. Producing food also always involves exploiting the environment, what are known as “natural resources”. Food waste and food loss are also related to greenhouse gas emissions. At a time like today, when the environment is increasingly under pressure, the environmental crisis is intensifying and both hunger and food insecurity still haunt the world, it is totally incoherent to produce food and waste it or let it spoil.

However, it’s true that no one makes the decision to buy food only to not eat it or let it expire in the fridge. Just as eating behavior involves many factors and cannot be simplified, the same is true of food waste. David Evans, in the book Food Waste, the result of his research on this subject, points out that, in domestic consumption, food becomes “surplus” as a result of processes that are related to factors that include everything from the ways in which food is made available in supermarkets (for example, packages with a large volume of a particular food), to domestic routines that include definitions of what is adequate food, and does not necessarily have to do with the intention to waste food, with irresponsibility or not caring about this waste.

What’s more, it’s always good to remember that it’s not just in the domestic environment that food is wasted or lost. This process starts much earlier, in the fields, where food is produced, and also includes the handling and transportation stages, supply centers, supermarkets and consumers. Not that this absolves families or individuals of their responsibility and the need to cultivate more conscious consumption, but the issue must be looked at and dealt with from a much broader perspective, involving specific policies, planning and technologies.

Another point is that the approach cannot be generalized, since food waste in the domestic environment is much higher in more economically advantaged countries, where people have greater purchasing power. According to the FAO, waste in developed countries is as high as 40% in the final chain. In developing countries, the biggest problem is food loss related to a lack of planning and conservation technologies.

To conclude, although the problem of food waste or loss is complex and its incidence cannot be generalized, the fact is that its consequences have contributed to exacerbating problems in the social, environmental, cultural and economic spheres, with increasingly global repercussions. In recent months, unfortunately, extreme weather events around the world have shown that these consequences are no longer just a prediction for a distant future.

Comida, desperdício alimentar e o que venho aprendendo ao longo dos anos

Nos últimos anos, especialmente depois que comecei a pesquisar o tema da sustentabilidade relacionado à alimentação e à produção de vinhos, passei a enxergar o desperdício alimentar com uma lente de aumento. Ao mesmo tempo, no meu cotidiano, comecei a sentir um incômodo cada vez maior com esse desperdício e uma necessidade de contorná-lo, ao menos no que diz respeito às possibilidades que tenho nesse sentido. 

Uma sucessão de fatos fez com que eu me tornasse mais permeável à mudança de hábitos relacionada a evitar o desperdício de alimentos. O fato de ter abraçado o vegetarianismo por vários anos ajudou a expandir meu repertório alimentar e a lidar com os alimentos de uma outra forma. Ao cozinhar, comecei a aproveitar ao máximo legumes, verduras e frutas, incorporando nas receitas suas cascas, talos, folhas, ou seja, partes da planta que geralmente são descartadas. Por exemplo, passei a cozinhar a abóbora com a casca, a utilizar os talos do brócoles, da couve-flor, da salsa e também folhas, como as da beterraba e as do aipo. 

Com o passar do tempo, à medida que comecei a mergulhar mais a fundo na pesquisa acadêmica relacionada às problemáticas envolvendo a produção de resíduos a partir do tema da sustentabilidade, adotei uma outra tática. Em vez de comprar os alimentos pensando em criar determinadas receitas, passei a cozinhar principalmente a partir do que compro na feira agroecológica aos finais de semana e do que tenho disponível na minha geladeira.

Dessa forma, criei o hábito de condicionar minha alimentação também à sazonalidade de frutas, legumes e verduras. Além disso, passei a evitar ao máximo jogar alimentos fora ou deixar que estraguem sem aproveitá-los e uma das soluções para isso não acontecer foi reduzir a quantidade de alimentos comprados. O congelamento de excedentes de comida ou de ingredientes também se tornou um recurso no mesmo sentido. 

Talvez esses exemplos sejam absolutamente básicos ou mínimos, em termos de sustentabilidade na cozinha, mas aos poucos vou aprendendo mais sobre o assunto e tentando me aprimorar. Nunca me considerei propriamente uma ativista ambiental, até porque ações nesse sentido vão muito além da cozinha. Afora isso, confesso que, apesar de todos os meus esforços, nem sempre consigo seguir todas essas “regras” autoimpostas à risca. Algumas vezes, acabo comprando alimentos demais e muitos desses alimentos não esperam com a mesma vitalidade até que eu tenha vontade de incluí-los em uma receita ou que alguma outra situação não prevista me faça adiar o seu consumo, como ter vontade de comer alguma outra comida ou mesmo optar por fazer algumas refeições fora de casa. 

Segundo dados da FAO, um terço da comida produzida no mundo é perdida ou desperdiçada todos os anos. Produzir alimentos também envolve sempre explorar o meio ambiente, o que se chama “recursos naturais”. O desperdício de alimentos e a perda de alimentos também estão relacionados a emissões de gases de efeito estufa. Em uma época como a de hoje, em que o meio ambiente está cada vez mais sob pressão, a crise ambiental vem se acirrando e tanto a fome quanto a insegurança alimentar ainda assombram o mundo, é totalmente uma incoerência produzir alimentos e desperdiçá-los ou deixar que estraguem. 

Mas é certo que ninguém toma a decisão de comprar alimentos para não os consumir ou deixar que percam sua validade na geladeira. Assim como o comportamento alimentar envolve muitos fatores, não podendo ser simplificado, o mesmo ocorre com o desperdício ou a perda de alimentos. David Evans, no livro Food Waste, resultante de sua pesquisa sobre este tema, ressalta que, no consumo doméstico, alimentos tornam-se “excedente” como resultado de processos que tem relação com fatores que incluem desde as formas como os alimentos são disponibilizados nos supermercados (por exemplo, embalagens com grande volume de um determinado alimento), até rotinas domésticas que incluem as definições sobre o que é alimentação adequada, e não necessariamente tem a ver com a intenção de se desperdiçar alimentos, com uma irresponsabilidade ou não se importar com esse desperdício. 

Além do mais, é sempre bom lembrar que não é apenas no ambiente doméstico que ocorre o desperdício ou a perda de alimentos. Esse processo começa bem antes, desde o campo, onde são produzidos os alimentos, e inclui ainda as etapas de manuseio e transporte, as centrais de abastecimento, os supermercados até chegar nos consumidores. Portanto, não que isso isente a responsabilidade de famílias ou indivíduos e da necessidade de cultivarem um consumo mais consciente, mas a questão deve ser observada e tratada de uma perspectiva bem mais ampla, envolvendo políticas específicas, planejamento e tecnologias. 

Um outro ponto é que não se pode generalizar o enfoque, já que o desperdício alimentar no ambiente doméstico é muito maior em países mais favorecidos economicamente, em que os indivíduos tem maior poder aquisitivo. Segundo a FAO, o desperdício em países desenvolvidos chega a ser de 40% na cadeia final. Nos países em desenvolvimento, o problema maior é a perda de alimentos relacionada à falta de planejamento e tecnologias de conservação. 

Para concluir, se o problema do desperdício ou perda alimentar é algo complexo e, ao mesmo tempo, não se pode generalizar a sua incidência, o fato concreto é que, as suas consequências vêm contribuindo para acirrar problemáticas em âmbitos social, ambiental, cultural e econômico com repercussão cada vez mais global. Nos últimos meses, infelizmente, eventos climáticos extremos ao redor do mundo vêm mostrando que essas consequências já não são mais somente uma previsão para um futuro distante. 

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