Comida · Food

What will we eat tomorrow?

Photography by Carla Rocha – Blackberries

One of the topics that has captured my interest, especially in the last year, is the future of food. My interest is mainly justified by the scenario that is emerging, in which the advance of the climate crisis and its direct or indirect consequences on food in a broader sense are remarkable.

I confess that it’s an interest mixed with a certain concern. Some of the most severe weather events in the world have damaged various crops. This means not only shortages, but also an increase in the price of many foods. In countries where access to food is already difficult, the situation is likely to worsen. In countries with greater food diversity, however, it will most likely mean that a quality diet, especially one based on a variety of fresh foods, grains and cereals, will be increasingly limited to a very small portion of the population. The vast majority will increasingly rely on ultra-processed products.

One issue that has been raised about the future of food is the projected growth of the world’s population, which is estimated to reach 9 billion by the year 2050. As food-related problems are exacerbated by the climate crisis, the question arises as to whether it will be possible to feed this entire population in the future.

The development of food production technologies based on population growth was the main argument behind the Green Revolution that began in the middle of the last century. We know that, especially since then, the increasing use of monocultures and the systematic use of synthetic fertilizers and pesticides have made agriculture one of the main causes of the environmental crisis we face today.
We know that the increasing use of monocultures and the systematic use of synthetic fertilizers and pesticides have made agriculture one of the main contributors to the environmental crisis we face today, not to mention the impact of these products on human health.

In the city where I live, Florianópolis, the world’s largest animal meat producer is building Brazil’s first laboratory meat research center. The multi-million dollar investment is scheduled to open in 2024. Very soon, we will see the results of this research in meatballs, hamburgers and sausages based on this type of meat, although, as in the United States, it will most likely be consumed by a minority due to its high cost.

While some people project the future of food from the laboratory and biotechnology, others, observing the extent to which our food has become impoverished and homogenized as biodiversity has diminished, advocate looking to the past. This is the perspective of Taras Grescoe, author of The Lost Supper, for whom the future of food lies in those foods that have been lost, forgotten, or almost disappeared. In the same vein, Dan Saladino, in his book Eating to Extinction, points to the danger of creating more uniform crops, since a global system based on a limited selection of plants and a few varieties runs a great risk of succumbing to disease, pests, and climatic extremes.

A great diversity of plants has accompanied most of human history. When it comes to lab-grown foods, we don’t have much idea of what they will be in the future. But if we take the example of what has happened with the spread of other ultra-processed foods, not only have they not solved world hunger, they have created a number of problems, especially with regard to human health.

Whether we look to the past or to the laboratory, the only certainty we have is that the future of food is becoming increasingly uncertain.

O que comeremos amanhã?

Um dos temas que tem me despertado muito interesse, especialmente nesse último ano, é o relacionado ao futuro da alimentação. Meu interesse se justifica principalmente por conta do cenário que vem se configurando, em que é notável o avanço da crise climática e suas consequências diretas ou indiretas na alimentação de uma maneira mais ampla. 

Confesso que é um interesse misturado com uma certa preocupação. Alguns eventos climáticos mais rigorosos ao redor do mundo vêm prejudicando cultivos diversos. Isso significa não apenas escassez, como também o aumento no preço de muitos alimentos. Em países que já enfrentam dificuldades no acesso alimentar a situação tende a se agravar. Já nos países que dispõem de uma maior diversidade alimentar, muito provavelmente, isso significa que uma alimentação de qualidade, isto é, especialmente aquela baseada em uma variedade de alimentos frescos, grãos e cereais, talvez fique progressivamente restrita a uma pequeníssima parcela da população. A grande maioria vai depender cada vez mais dos produtos ultraprocessados.  

Um ponto que tem sido levantado a respeito do futuro da alimentação é o da projeção de crescimento da população mundial, estimada para alcançar 9 bilhões até o ano de 2050. Na medida em que os problemas ligados ao campo alimentar em decorrência da crise climática tendem a se acirrar, a questão é se no futuro será possível alimentar toda essa população.

O desenvolvimento de tecnologias para a produção alimentar baseado no  crescimento da população foi o argumento principal da Revolução Verde, iniciada em meados do século passado. Sabemos que, especialmente a partir desse período, o implemento crescente de monoculturas, o uso sistemático de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos transformou a agricultura em uma das principais responsáveis pela crise ambiental que enfrentamos hoje, sem contar os impactos do desses produtos na saúde humana. 

O mesmo argumento de crescimento da população tem sido repaginado e utilizado pela indústria de ultraprocessados, mais especificamente, a da carne cultivada em laboratório.  Essa carne, produzida a partir de células animais, tem sido vendida como uma alternativa para suprir a necessidade de proteínas no futuro, e é defendida como algo até mesmo mais sustentável do ponto de vista ambiental, considerando a redução das emissões de gases com efeito de estufa, já que são utilizadas menos terras em comparação com a pecuária.

Na cidade onde eu vivo, Florianópolis, a maior empresa global de produção de carne animal está implantando o primeiro centro de pesquisa para carne em laboratório do Brasil. O investimento milionário é previsto para ser inaugurado em 2024. Muito em breve, já veremos o resultado da pesquisa em almôndegas, hamburgueres e embutidos a base desse tipo carne, embora, a exemplo de ocorre nos Estados Unidos, muito provavelmente, considerando o seu alto custo, vai ser destinado ao consumo de uma minoria.

Enquanto alguns projetam o futuro da comida a partir de um laboratório e da biotecnologia, outros, ao observarem o quanto nossa alimentação foi empobrecendo e se homogeneizando com a diminuição da biodiversidade, defendem olharmos para o passado. Essa é perspectiva de Taras Grescoe, autor de The Lost Supper, para quem o futuro dos alimentos está naqueles alimentos perdidos, esquecidos ou quase desaparecidos. Na mesma vertente, Dan Saladino, em seu livro Eating to Extinction, chama a atenção para o perigo de se criar culturas mais uniformes, uma vez que um sistema global baseado em uma seleção restrita de plantas e de poucas variedades corre um risco grande de sucumbir a doenças, pragas e extremos climáticos.

Uma ampla diversidade de plantas acompanhou a maior parte da trajetória humana.  No que se refere aos alimentos produzidos em laboratório, não temos ainda tanta ideia do que representarão mais adiante. Mas se tomarmos o exemplo do que ocorreu com a disseminação de outros ultraprocessados, além de não resolverem a fome no mundo, criaram uma série de problemas, sobretudo no que se refere à saúde humana. 

Olhando para o passado ou para os laboratórios, a única certeza que temos é que o futuro da alimentação tem se tornado cada vez mais cheio de incertezas. 

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